Trump pode aumentar taxa sobre etanol brasileiro, e indústria reage
Governo norte-americano usou álcool para exemplificar mercados que precisam ser mais reciprocidade econômica, na perspectiva dele
A indústria do aço não é o único setor brasileiro ameaçado pelo ímpeto tarifário do presidente dos EUA, Donald Trump. O governo norte-americano sugeriu, nessa quinta-feira (13/02), que pode aumentar a taxação do etanol do Brasil. O mercado brasileiro reagiu e aponta que, caso a medida seja concretizada, haverá danos não somente econômicos, mas climáticos.
EUA e Brasil são, respectivamente, o primeiro e o segundo maiores produtores de etanol do mundo. Hoje, o produto brasileiro sofre uma tarifa de 2,5% para entrar nos EUA. Já o combustível norte-americano está submetido a um imposto de 18% ao chegar ao Brasil. Como parte de um plano de estabelecer reciprocidade com seus parceiros comerciais, Trump estuda alterar as taxas, o que poderia elevar em 7,2 vezes a tarifa paga pelo Brasil, caso ela subisse ao mesmo patamar da norte-americana.
Em 2024, o Brasil importou cerca de 110,7 mil m³ de etanol dos EUA, em transações que somaram US$ 50,5 milhões, e exportou o triplo de volume — 313,3 mil m³, equivalentes a quase US$ 182 milhões, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
O governo dos EUA responde a uma demanda da indústria nacional e à narrativa de proteger as empresas e empregos norte-americanos, promessa de campanha de Trump. Em seu site, a Casa Branca replicou uma nota da Associação dos Combustíveis Renováveis dos EUA: “por quase uma década, gastamos tempo e recursos preciosos lutando contra um injusto e injustificável regime tarifário do Brasil sobre as importações de etanol dos EUA. O que é irônico é que essas tarifas foram erguidas contra os EUA enquanto nosso país tem abertamente aceitado — e mesmo encorajado e incentivado — importações brasileiras”.
Por outro lado, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) e a Bioenergia Brasil, principais entidades do setor no Brasil, avaliam que a decisão de Trump é um “retrocesso”. “A medida pretende colocar no mesmo patamar o etanol produzido no Brasil e nos Estados Unidos, embora possuam atributos ambientais e potencial de descarbonização diferentes, e portanto não faz sentido falar em reciprocidade. Se a medida se confirmar, será mais um passo dos Estados Unidos rumo ao abandono à rota de combate à mudança do clima”, pondera a nota conjunta das instituições.
Em entrevistas à imprensa brasileira desde o comunicado da Casa Branca, o presidente da Unica, Evandro Gussi, disse apostar que, mesmo se houver aumento da tarifa, Estados norte-americanos não deixarão de comprar etanol brasileiro graças à menor pegada de carbono do combustível do Brasil em comparação ao concorrente — a do Brasil é três vezes menor, segundo o governo.
O presidente da Bioenergia Brasil, Mário Campos, endossa essa perspectiva. “Em termos ambientais, nosso etanol é melhor do que o americano. Em muitos Estados americanos, a questão da pegada de carbono é valorizada, como na Califórnia. Os EUA têm um grande excedente exportável de etanol, não é à toa que eles querem exportar para o Brasil, mas, mesmo assim, compram etanol brasileiro. Essa é uma negociação que ocorrerá entre governos”, diz.
Em coletiva de imprensa na noite de quinta-feira, o vice-presidente Geraldo Alckmin avaliou que uma via de negociação pode ser o estabelecimento de uma cota de exportação para os EUA — isto é, um acordo para definir um limite de etanol que pode ser exportado para o país. A estratégia foi utilizada para o aço em 2028, por exemplo, no primeiro mandato de Trump.
Quanto à preocupação do governo norte-americano sobre a reciprocidade tarifária para os produtos em geral, Alckmin afirmou que, hoje, já existe um equilíbrio da balança comercial entre os dois países. “É natural que o novo governo americano queira avaliar o seu comércio exterior, estudar, avaliar a questão do comércio exterior. O Brasil não é problema comercial para os Estados Unidos. A balança comercial nossa de bens é equilibrada. Nós exportamos US$ 40 bilhões e importamos US$ 40 bilhões”, disse.